quarta-feira, 16 de dezembro de 2009
O meu poema PALPITAÇÃO mereceu o comentário do grande poeta da Geração de 45, Gilberto Mendonça Teles.
Palpitação
Se você ousou, o que importa?
O tempo é ontem
quando tudo valeu a pena.
Se você chorou, não cuide mais.
O sentido do pranto já está
incurso no corpo do poema.
Se temeu, então que seja.
O alarme do gato só se elucida
durante o salto.
Nada é tão puro
e nem tão indiferente
para um coração doído.
Mesmo a ave que voa livre
traz no peito (e sofre ainda)
aquele gato excluído.
Ricardo Sant'Anna Reis
(...) Nota-se inicialmente que o poema é formado de cinco tercetos, mas com estrofes livres, cada uma com a sua significação. A única coisa que as liga é a repetição anafórica da conjunção “Se” que aparece nas três primeiras estrofes, num tempo passado, aparentemente passado, mas que se torna presente na enunciação do poema.
O sujeito lírico do poema está falando num presente invisível, só perceptível na oposição tempo da enunciação do poema versus tempo do enunciado no poema.
Há um sentimento de frustração na primeira estrofe, como se a ousadia (o ato de ousar) fosse coisa do passado. Não só a ação do verbo se dá no passado, reforçada por um “ontem”, como se nada no presente valesse a pena e a felicidade estivesse no passado. No entanto é no presente que se avalia o passado.
No segundo terceto passa-se do ato de “ousar” para o de “chorar”, mas com o sujeito lírico informando que “o pranto já / está incurso no corpo do poema”. Ou seja, começa-se a ter consciência de que o real empírico passa a ser o “real” do poema.
A terceira repetição do processo de estruturação do poema começa com “Se temeu”, quando o sujeito do poema assume diretamente a ação de temer e a aceita, introduzindo uma imagem ousada, quase surrealista: o pulo de um gato metafísico.
É por causa dessa imagem que o processo de repetição anafórica se detém e o sujeito do poema assume toda ação no presente, mesmo deixando entender que seu coração se abalou com a ousadia e o temor da imagem do gato saltando. Tanto que a última estrofe o “vôo do gato” cede lugar ao “vôo livre” de uma ave que não consegue apagar a lembrança do “salto” que alarmou o coração do sujeito lírico que é, afinal o próprio poeta. Não é à-toa que as duas estrofes finais se ligam por uma rima final que introduz um ritmo novo no poema (...)
Gilberto Mendonça Teles, Rio, 16.12.2009.
'Agradeço comovido, mestre e poeta maior, a sua generosa e bela exegese de meu poema" - Ricardo S. Reis
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Um comentário:
Olá Ricardo!
Parabéns pelo belo poema 'Palpitação' e justa exegese.
'Mesmo a ave que voa livre
traz no peito (e sofre ainda)
aquele gato excluído'.Lindo!
Beijos
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