Meu amigo da fome,
meu compadre poeta,
comemos sem fastio
nossa farinha adversa.
A farinha da poesia –
farinha feita de terra –
que polvilha todas as coisas
com seu corpo de areia.
Forçamos seu adoçar,
farinha grossa e azeda,
mas não adocicando ao ponto
das formigas quererem-na,
adocicando-a apenas
para esconder a aspereza
sem deixar se perder
seu caráter de areia.
A farinha da poesia
comemos sem pressa,
mas temos fome de glutões,
fome que não cessa;
comemos sem pressa
e sem pressa terminamo-la,
do alguidar ou panela
em que ela se encontra;
comemos diariamente
e sempre a resposta inversa:
ao invés de saciarmo-nos
temos mais fome dela.
Diariamente comemos
e todo dia sempre a mesma
fome, fome que ultrapassa
à fome da matéria.
É uma fome mais que fome,
fome calcária, de pedra,
criando dentro do abdômen
pedregulhos e estelas,
é uma fome mais que fome,
absurda e concreta,
é uma vontade de comer
e ser comido por ela.
2 comentários:
Fabiano, mesmo imerecido, este tão belo poema me emociona...obrigado poeta...
Que é isso, Ricardo.
Tanto é merecido que o poema se fez,
que as palavras se procuraram,
que mãos a desenharam no papel,
que a ideia foi proposta no espaço, viajante, etérea.
Única fatalidade foi ter sido eu o auscultador,
mas outros poetas virão!
Um abraço.
Fabiano Silva
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