quinta-feira, 28 de maio de 2009
Conversa por sobre o oceano que nos separa e une
MEU IRMÃO BRASILEIRO
Língua da minha língua
braços dos meus abraços que vão e vem do mesmo mar
que nós une, que nos continua gota a gota
uns dentro dos outros
como o bruar das suas ondas
ondas dentro das ondas
até o confim dos tempos
Eco do meu falar a língua mãe
no seu berço hoje amordaçada
Meu irmão brasileiro...
Levo na boca um cantar que há tempos fica calado.
ao peito acode apenas pranto
Levo na fronte uma estrela cuja luz se quer ir apagando
mesmo ela não querendo...
Meu irmão brasileiro...
Deixa-me que te conte...
se tu me miras eu me vejo
se tu me falas eu me ouço
e mesmo que o mundo
me quiser negar a voz,
eu falarei
se tu me ouves eu falarei...
e talvez assim se me cure esta incurável saudade
Meu irmão brasileiro...
Concha Rousia, Galiza
MINHA POETA GALEGA
Pois que te deixem falar
a língua matter, qual palmae
ou carvalho a fertilizar os tempos
em seu entorno.
Os teus falares têm ainda a dicção
do latino verbo fundador do pensamento
e de nossa forma de amar ao outro
e a natureza.
Que te deixem azular este céu
com as tuas palavras castiças
que me levam neste momento
aos bosques profundos
da profunda Galiza.
Palavras, pois, que nos unem
sobre este mar de tonalidade
verde profundo.
Deixem-te às palavras
que perduram, ao limbo
das exigências vãs da política
do vernáculo e da vaidade
para que tu as resgate
e que voltem ao alumbramento
como seres sagrados da memória.
Com os teus pares, deite bela
ao ar tua lira quinhentista.
Que te deixem ao direito de existir
irmã galega, em tua língua, tua história
tua identidade, tua pátria primal
que também é a do meu desejo
o desejo de essência que me avia.
Se te vês cansada, lute ainda mais
Se te desanimas, não recues
do que te cabe.
Os destinos validos
são os que se projetam sobre o tempo
e ascendem, sobre as noites, os claros dias.
Aquelas que promoves
são as justas refregas
em que não cabem áis
e que tem o matiz que sabe
de tua santa indignação.
Tua idéia inarredável
ilumina homens e mulheres
de idéias, pelo mundo afora
como o pequeno
Farol de Alexandria
rasgando o véu da noite.
Ah, interstício da vida que vai
em que ao sopro vaporoso
de uma Canção de Amigo
tu me embalas no soar
de teu banjo medieval.
Pois que não te possam
calar jamais.
Ricardo Sant’Anna Reis, Brasil
quarta-feira, 27 de maio de 2009
Actas para palavras proibidas
poeta sou como o rapace de palavras e as roubo assaz quando as pego cruzando pélagos em asas lépidas de melra levando ao bico as mensagens de salvação da alma e quando não são as melras são as enguias com sua escorrencia original espargimentos elétricos e ciclonicos da nivia linfa imponderável e das linhagens universais quero as palavras de essência esquecidas nos léxicos palavras que façam sentido ou não mas que eu as pilhe enquanto permeie prados viçosos e lavras e nas covas as letras mortas por mãos diáfanas plantadas no chão mesmo no assombro serão as tais palavras como plasmas fertilizantes como placentas confeccionarias de elegância sutil vibrátil e circunflexa os meus poemas são velhos como eu mesmo sou velho no mirar eu surpreendo (as palavras velhas) sobrevivendo nas sombras da caridade alheia e ao abrigo das emoções nos dizeres do povo ou enquanto palavras múmias estrambóticas sem carne sem rosto de sagas antigas como a porosidade de ossos de argonauta eu as uso no assento e na pausa reconhecível de meus versos caducos ah, Marinetti e esta velocidade progressista que me atropela se me cortam as palavras fazem-me impassível eunuco ah, esta cidade-limite em flor os meus versos, como foi dito pelos que supostos lhes sabem não são poética excedidos e anacrônicos que são desconexos de um tempo presente ainda roubo palavras de uns poetas barrocos d’alemar que as tem por perto mas que a vaidade não se lhes permitem que se dêem conta de que o poema é sempre maior do que o poeta só me pugno por um tempo que me seja válido que não permaneça estático que só se o pressentissem na evanescencia d’alma ou em um murmúrio infiel de esquálido e expurgado afeto ah, as palavras como as desejo! sobrevoam benditas ou malditas como pássaros soluços na solidão da noite ao balouçar de um tisnado pessegueiro de jardim palavras internas na brisa da madrugada ah, ai de mim, minha fada! como se me faz triste saber tantas formas abandonadas no lixo da história como flores que são murchas restos de palavras nunca ditas que jamais se exercerão renovadas
Ricardo S. Reis & Claudia Gonçalves
Ricardo S. Reis & Claudia Gonçalves
domingo, 17 de maio de 2009
A INTEIREZA DO SER
Supondo-me inteiro
Inteirastes-te de mim
Eu que me havia parvo
Canhestro e cobarde
Sombra perdida de exilado
Inteirastes-te de mim
Eu que me havia parvo
Canhestro e cobarde
Sombra perdida de exilado
Serafim.
Tentastes, então
Tentastes, então
A leitura ilesa
Dos signos
Dos signos
Por fim
No transluzir
No transluzir
Do éter de minh’alma.
Qual nada.
Eu era pura opacidade
Nenhuma inteireza.
Delirante
Nenhuma inteireza.
Delirante
Acostumei-me
Ao sentido de ser metade.
Quisera eu, meu amor
Ao sentido de ser metade.
Quisera eu, meu amor
Ser possuído
E por inteiro
Por uma infinita verdade.
E por inteiro
Por uma infinita verdade.
A DUALIDADE DA VIDA
A vida, meus senhores
Não é assim tão leve
Não se a vive impune.
Não é assim tão leve
Não se a vive impune.
A vida, senhores
É o cume, acúmulo
Afiado gume do amar
Semibreve instante
Num circo de horrores.
Ah, mas não é que seja sempre.
A vida mesmo não se lhe pesa
Se do viver se quer apenas
O devanear.
E se a flama é toda
Num momento
De não sobrar
De não sobrar
Para fiar penhores.
Fez-se dual a parcela de amor
Que coube em uma vida
Ora opaca ou transparente.
Se em uma hora
Se quer morrer de dor
Noutra, já nada mais se sente.
Noutra, já nada mais se sente.
sexta-feira, 15 de maio de 2009
IRA
Por vezes me toma tal calor
Que de grande
Que de grande
Me arde por dentro
Quase que o fogo do inferno
Queimando-me; e eu não me agüento.
Às vezes se introduz neste ardor
Em meu intimo, o veneno melífluo
E viscoso a que chamam de Amor.
Ah, vicio nefasto qual cocaína.
Ah, este sentir que queima de fulgor e medo.
Quase que o fogo do inferno
Queimando-me; e eu não me agüento.
Às vezes se introduz neste ardor
Em meu intimo, o veneno melífluo
E viscoso a que chamam de Amor.
Ah, vicio nefasto qual cocaína.
Ah, este sentir que queima de fulgor e medo.
Eterna sina, divina e perene pira.
Ah, este sentir que calcina a alma inefanda
A obscuridade do Amor, tornado em Ira.
Ah, este sentir que calcina a alma inefanda
A obscuridade do Amor, tornado em Ira.
segunda-feira, 4 de maio de 2009
O TREM DE FERRO
O trem que, menino
do Rio de Janeiro me levava
rompia ventos com a impaciência
rompia ventos com a impaciência
que ao fim da jornada antecipava.
Café-com-pão, piiuuiiiiiiii...
Apenas eu ia absorto e inteiro
e o maquinista
Café-com-pão, piiuuiiiiiiii...
Apenas eu ia absorto e inteiro
e o maquinista
na curva, ia apitando.
Eu só imaginava, pois que não existia
(não se via) nenhum maquinista
nem curva.
Havia somente o dia se dissolvendo ligeiro.
Olhava pela janela e engolia com o vento
o momento passageiro.
Não dava contas
na viagem
dos contornos da serra mineira
(que agora recupero na lembrança)
disperso que estava na sacolejante
monotonia da paisagem.
Súbito, como no sonho d’Alice
o meu olhar se fixava na casa pobre
de taipa, que se via
bem no meio da planície verde.
A casa, já entrada no escuro da noite
pela lenha que ardia no fogão
em magia, se alumiava.
Tinha um olhar conspícuo
A casa, já entrada no escuro da noite
pela lenha que ardia no fogão
em magia, se alumiava.
Tinha um olhar conspícuo
(a casa) um olhar de eternidade
e vigiava o trem de ferro
em que também viajavam
em que também viajavam
as minhas conjecturas
de criança
de criança
inócuas, inócuas.
E o trem, já então na lonjura
com a pressa da chegada
ainda, em cada curva
E o trem, já então na lonjura
com a pressa da chegada
ainda, em cada curva
parecia que apitava.
POEMAS ETERNOS AO VENTO
Ode à Neftalí Ricardo Reyes Basualto (Pablo Neruda).
Os ares madrigais que varejam o atlântico, dizem, poeta
de seus disseminados ventos, andinos, cegos, ressonantes
ventos que percorrem prados altos, plantações de trigo
e que balançam os longos cabelos das moças índias.
Há tempos que tais ventos vagueam por liberdade
esta musa, que, perseguida pelos infames é almejada
pelos poetas e vive no anseio que não se finda
dos povos do americano continente.
Procuro-te poeta pelos charcos clandestinos
pela pátria esquecida, pelos rios, veias rubras d´aurora.
Sobre igarapés, voam colibris e maritacas buscando o néctar
e os grãos. Já os visionários, seguem em direção ao poente.
Faz-nos falta o poeta da fome e da chuva, o poeta dos estios
da crepuscular dinamite, o pavio, o poeta das visagens telúricas
da noite, alpinista dos altiplanos de versos solares e sombrios.
Saciedade é a palavra que te revela
no alentado sentimento hermano.
Vida que cantastes em odes cheias
à labuta nas minas de cobre, estanho e carvão.
Que cantastes na canção do sal, nunca hermético
ao sentir dos injustiçados.
Teu poema argila vai modelando a vida
processando no desejo da luta líquida e contínua
e é servido em arpejos de anjos
para a consumição existencial.
Diz-me poeta de Antofogasta e de Parral:
- Que lhe diz a meia-noite profunda?
Tenho chorado, tenho chorado!
Teu povo americano (já éra hora) quer de novo canta-lo
numa ária gauchesca
como pluma atonal
num canto que enseje o poder de alcançar-te
nas plagas do ateu firmamento em que habitas
o poema eterno.
É hora de levar-te em passeio, do Chile às Minas Gerais
em visita a outro poeta, de outra tragicidade, de alma mineral
como a tua, plena de ferro e nuvem.
Retirar-te-ia um pouco de tua navegação
no sombrio pacifico de águas frias e perigosas
onde velejas como gostas, guardião de fronteiras
do Ethos latinamericano em formação.
Teu barco, teu verso de serenas sedas enfunadas
nos mares canônicos da beleza ocidental.
Odisseu redivivo de esperanças, deves ver de novo
os grandes condores do sul continente, aos pés da Patagonia.
Estes pássaros estão descendo
as paredes de montanhas de tua pátria
para selar o teu testamento de amor.
Escrevestes na consciência do tempo tuas odes
teus poemasde amor, promessas de um arrebol sem vilipendio.
Ecoam hoje sobre as nuvens das sensibilidades
no farfalhar da feira de Valparaiso
ou na Europa Setentrional
e também aqui no Brasil
de onde te revisito em poesia e pensamento.
Há um canto novo que todos os que quis ver irmanados
cantarão a uma só voz; toda a vida na mesma elegia.
E devemos cantar o poeta, antes mesmo que a poesia.
Vejo os ativos obreiros na zona industrial.
Vem e vão à construção de casas ricas
subindo paredes nuas.
Vejo crianças correndo à sorrelfa
mulheres livres e as moças pudicas
fervilhando pelas ruas.
Pergunto a ti, poeta: - Desde quando se descobriu
amando assim a teu povo? Onde mais é que se viu
um amor assim, tão probo? Um amor profundo, Isla Negra.
Aquele que te esqueceu, agora te reconhece
no cimo dos edifícios, cordilheiras urbanas
no lácio, nas oficinas...
Teu nome é cantado nas publicas Ágoras de maio
por gerações operarias no mundo inteiro.
Mas nós só pudemos cantá-lo hoje, pois o Chile tricolor
mereceu o esquecimento, a fuga das consciências relevantes
e esteve entregue a uma elite vil e conservadora.
Morreu o Chile da Unidade Popular, quando mataram a tua presença
e juventude, quando se calou Violeta Parra
e da lira maiakoviskiana de Vitor Jarra
fluiu a sua toda essência na dor do povo dizimado.
Morreste tu, oh, poeta, para ficardes etéreo
e vigilante como a um andino vento.
Um dia, há poucos anos, a TV mostrou-nos juizes ingleses dando motivos
desde o centro do império, para crer na justiça: - O monstro do Chile
perdia as suas imunidades!
E antes que as recuperasse por artes da política
em nome da “normalidade democrática”, rimos, gozamos
e nosso maior regozijo foi ver as mães ofendidas no ventre
no grito calado e no olhar triste, roubadas nas noites insones
sorrirem, sorrirem, em um muito franco sentir de alegria.
Agora nos dizem os jornais: - O maléfico verdugo do Chile
chega aos seus estertores! Que morra logo, tal verme
e leve sua semente para um solo calcinado
para que não corramos o risco de que lhe fique lembrança.
Desce aos infernos, carrasco! As humilhações do inglês desterro
em nada se comparam à orfandade promovida
crianças ensurdecidas de medo
para as quais o Lacaio dos Ianques
destampou a Caixa de Pandora
obrigando-as a que ouvissem os lancinantes gritos dos pais
cantantes da humana ventura chilena.
Tomemos um vinho do Valle Central, poeta
pois a dor que durou decênios
anuncia que a nossa fraqueza
não é mais do que força e virtude.
Não durou, o morto-vivo, mais que tu
que perduras eternamente, poesia, mais que poeta.
Sepultemos estes tempos no eterno esquecimento
a mais humana das soluções.
Nossa flama pequenina vai agora florescer.
Vem poeta Neruda, venha ver!
Acorde também a Allende
para o renascimento do Chile.
Já se derramam pelas cordilheiras
quedas de lirismo (aonde antes
só dor e desesperança), águas que vão
ao coração do pacifico
encontrar com os ventos nobres
de Frida Khallo, que vem vindo, vem vindo
desde o Valle do Yucatan
de onde a voz da liberdade, ainda nos pode alcançar.
Os ares madrigais que varejam o atlântico, dizem, poeta
de seus disseminados ventos, andinos, cegos, ressonantes
ventos que percorrem prados altos, plantações de trigo
e que balançam os longos cabelos das moças índias.
Há tempos que tais ventos vagueam por liberdade
esta musa, que, perseguida pelos infames é almejada
pelos poetas e vive no anseio que não se finda
dos povos do americano continente.
Procuro-te poeta pelos charcos clandestinos
pela pátria esquecida, pelos rios, veias rubras d´aurora.
Sobre igarapés, voam colibris e maritacas buscando o néctar
e os grãos. Já os visionários, seguem em direção ao poente.
Faz-nos falta o poeta da fome e da chuva, o poeta dos estios
da crepuscular dinamite, o pavio, o poeta das visagens telúricas
da noite, alpinista dos altiplanos de versos solares e sombrios.
Saciedade é a palavra que te revela
no alentado sentimento hermano.
Vida que cantastes em odes cheias
à labuta nas minas de cobre, estanho e carvão.
Que cantastes na canção do sal, nunca hermético
ao sentir dos injustiçados.
Teu poema argila vai modelando a vida
processando no desejo da luta líquida e contínua
e é servido em arpejos de anjos
para a consumição existencial.
Diz-me poeta de Antofogasta e de Parral:
- Que lhe diz a meia-noite profunda?
Tenho chorado, tenho chorado!
Teu povo americano (já éra hora) quer de novo canta-lo
numa ária gauchesca
como pluma atonal
num canto que enseje o poder de alcançar-te
nas plagas do ateu firmamento em que habitas
o poema eterno.
É hora de levar-te em passeio, do Chile às Minas Gerais
em visita a outro poeta, de outra tragicidade, de alma mineral
como a tua, plena de ferro e nuvem.
Retirar-te-ia um pouco de tua navegação
no sombrio pacifico de águas frias e perigosas
onde velejas como gostas, guardião de fronteiras
do Ethos latinamericano em formação.
Teu barco, teu verso de serenas sedas enfunadas
nos mares canônicos da beleza ocidental.
Odisseu redivivo de esperanças, deves ver de novo
os grandes condores do sul continente, aos pés da Patagonia.
Estes pássaros estão descendo
as paredes de montanhas de tua pátria
para selar o teu testamento de amor.
Escrevestes na consciência do tempo tuas odes
teus poemasde amor, promessas de um arrebol sem vilipendio.
Ecoam hoje sobre as nuvens das sensibilidades
no farfalhar da feira de Valparaiso
ou na Europa Setentrional
e também aqui no Brasil
de onde te revisito em poesia e pensamento.
Há um canto novo que todos os que quis ver irmanados
cantarão a uma só voz; toda a vida na mesma elegia.
E devemos cantar o poeta, antes mesmo que a poesia.
Vejo os ativos obreiros na zona industrial.
Vem e vão à construção de casas ricas
subindo paredes nuas.
Vejo crianças correndo à sorrelfa
mulheres livres e as moças pudicas
fervilhando pelas ruas.
Pergunto a ti, poeta: - Desde quando se descobriu
amando assim a teu povo? Onde mais é que se viu
um amor assim, tão probo? Um amor profundo, Isla Negra.
Aquele que te esqueceu, agora te reconhece
no cimo dos edifícios, cordilheiras urbanas
no lácio, nas oficinas...
Teu nome é cantado nas publicas Ágoras de maio
por gerações operarias no mundo inteiro.
Mas nós só pudemos cantá-lo hoje, pois o Chile tricolor
mereceu o esquecimento, a fuga das consciências relevantes
e esteve entregue a uma elite vil e conservadora.
Morreu o Chile da Unidade Popular, quando mataram a tua presença
e juventude, quando se calou Violeta Parra
e da lira maiakoviskiana de Vitor Jarra
fluiu a sua toda essência na dor do povo dizimado.
Morreste tu, oh, poeta, para ficardes etéreo
e vigilante como a um andino vento.
Um dia, há poucos anos, a TV mostrou-nos juizes ingleses dando motivos
desde o centro do império, para crer na justiça: - O monstro do Chile
perdia as suas imunidades!
E antes que as recuperasse por artes da política
em nome da “normalidade democrática”, rimos, gozamos
e nosso maior regozijo foi ver as mães ofendidas no ventre
no grito calado e no olhar triste, roubadas nas noites insones
sorrirem, sorrirem, em um muito franco sentir de alegria.
Agora nos dizem os jornais: - O maléfico verdugo do Chile
chega aos seus estertores! Que morra logo, tal verme
e leve sua semente para um solo calcinado
para que não corramos o risco de que lhe fique lembrança.
Desce aos infernos, carrasco! As humilhações do inglês desterro
em nada se comparam à orfandade promovida
crianças ensurdecidas de medo
para as quais o Lacaio dos Ianques
destampou a Caixa de Pandora
obrigando-as a que ouvissem os lancinantes gritos dos pais
cantantes da humana ventura chilena.
Tomemos um vinho do Valle Central, poeta
pois a dor que durou decênios
anuncia que a nossa fraqueza
não é mais do que força e virtude.
Não durou, o morto-vivo, mais que tu
que perduras eternamente, poesia, mais que poeta.
Sepultemos estes tempos no eterno esquecimento
a mais humana das soluções.
Nossa flama pequenina vai agora florescer.
Vem poeta Neruda, venha ver!
Acorde também a Allende
para o renascimento do Chile.
Já se derramam pelas cordilheiras
quedas de lirismo (aonde antes
só dor e desesperança), águas que vão
ao coração do pacifico
encontrar com os ventos nobres
de Frida Khallo, que vem vindo, vem vindo
desde o Valle do Yucatan
de onde a voz da liberdade, ainda nos pode alcançar.
UNIVERSO OCULTO
Teu beijo
escasso
mostava
os dentes
enquanto
teu verso
curto
deixava
entrever
estrelinhas
nas
entrelinhas.
escasso
mostava
os dentes
enquanto
teu verso
curto
deixava
entrever
estrelinhas
nas
entrelinhas.
A MULHER DO QUARTO BRANCO
Recordo quando mirava
em abandono e transe místico
teu corpo nu, puro e branco
como a beleza simples de um vôo
definitivo como a evidência da partida.
Por alguns segundos, eras a aparição
da virgem, com os pêlos à mostra
de tez tão clara, com tão intensa fugacidade
que num sopro explodias, divinal melancolia
teu orgasmo sobre a noite
reacendendo o fulgor de um pleno dia.
Como rememorar este teu corpo
lânguido e pecaminoso?
Como olvidar o teu pranto
que nos devolvia a brisa
pelas artes de uma oração
à tarde quente?
Lembro-te como um vento brando
viração, aragem
fazendo fremer de maleita santa
as imposturasde minha lasciva carne
minha alma perdida
e os objetosde teu quarto branco.
em abandono e transe místico
teu corpo nu, puro e branco
como a beleza simples de um vôo
definitivo como a evidência da partida.
Por alguns segundos, eras a aparição
da virgem, com os pêlos à mostra
de tez tão clara, com tão intensa fugacidade
que num sopro explodias, divinal melancolia
teu orgasmo sobre a noite
reacendendo o fulgor de um pleno dia.
Como rememorar este teu corpo
lânguido e pecaminoso?
Como olvidar o teu pranto
que nos devolvia a brisa
pelas artes de uma oração
à tarde quente?
Lembro-te como um vento brando
viração, aragem
fazendo fremer de maleita santa
as imposturasde minha lasciva carne
minha alma perdida
e os objetosde teu quarto branco.
RODAR CATIVO
Os minutos se passam
quase audíveis
em refrão recorrente.
As horas se somam
plausíveis
cheias de promessa e sem nada deixar.
Os dias escorrem
entre os dedos
ceifados do calendário
e cerzidos na pele dos homens.
Os anos morrem
Amiúde
a cada manhã
retirados das pretensões gregorianas.
Como um filete no engenho d’água
os minutos, as horas, os dias e os anos
num rodar cativo, errático desperdício
incontrolável, surda repetição.
quase audíveis
em refrão recorrente.
As horas se somam
plausíveis
cheias de promessa e sem nada deixar.
Os dias escorrem
entre os dedos
ceifados do calendário
e cerzidos na pele dos homens.
Os anos morrem
Amiúde
a cada manhã
retirados das pretensões gregorianas.
Como um filete no engenho d’água
os minutos, as horas, os dias e os anos
num rodar cativo, errático desperdício
incontrolável, surda repetição.
sexta-feira, 1 de maio de 2009
SOBRAS DE UM TEMPO GRANDE
A Manuel Bandeira
Lançava mão dos silêncios
na noite, entre os meus
fantasmas.
De sapos que não mais havia
inda se ecoava o coaxar.
Adornada de estrelas
a noite divina e suave,
platinava.
Ah, sapo cururu
de minha infância.
Aonde foi parar?
Onde é o teu leito de rio?
No céu argênteo
de uma media luna
guardam-se poucos mistérios
da dimensão de minha ânsia
e da espessura das sobras.
Segui em passos ensaiados
na beira do charco, no chão.
Não existe mais saparia
nem mesmo o cio estelar.
O que ainda busco aluado?
Afinal, para que lado
a minha Pasárgada?
Como o pecador
do fim dos tempos
como um sufí delirante
conduzo o meu destino
em silencio
ao alvor da luz de velas
num rodopio bailado.
Lançava mão dos silêncios
na noite, entre os meus
fantasmas.
De sapos que não mais havia
inda se ecoava o coaxar.
Adornada de estrelas
a noite divina e suave,
platinava.
Ah, sapo cururu
de minha infância.
Aonde foi parar?
Onde é o teu leito de rio?
No céu argênteo
de uma media luna
guardam-se poucos mistérios
da dimensão de minha ânsia
e da espessura das sobras.
Segui em passos ensaiados
na beira do charco, no chão.
Não existe mais saparia
nem mesmo o cio estelar.
O que ainda busco aluado?
Afinal, para que lado
a minha Pasárgada?
Como o pecador
do fim dos tempos
como um sufí delirante
conduzo o meu destino
em silencio
ao alvor da luz de velas
num rodopio bailado.
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